Da catequese paroquial às escolas dominicais evangélicas, a cultura hebraico-cristã pauta a responsabilidade moral em um dogma fundamental: o livre arbítrio. A capacidade de tomarmos decisões por conta própria. Para ciências do cérebro o fato é parcial, na maior parte do tempo nossas escolhas estão condicionadas e tendem a ser automáticas. Mesmo a decisão de apertar um simples botão, pode ocorrer em nível de córtex cerebral. Iso significa que a escolha de apertar um botão é tomada antes de tomarmos consciência de nossa própria escolha. Com monitoramento e instrumento adequado seria possível até mesmo prever qual das duas mãos seria a escolhida para a tarefa.
O cérebro funciona com base em dois sistemas, o primeiro (S1) é rápido, instintivo, não consciente, baseado em experiências prévias e o segundo (S2) é aprendido, consciente e faz representação e simulação de probabilidades. O S1 por condicionamento repete padrões de comportamentos aprendidos em situações semelhantes com base em experiências prévias, pois é dispendioso para o cérebro realizar análises detalhadas de eventos cotidianos o tempo todo.
O cérebro tem uma predisposição a receber informações confirmatórias que se harmonizem com nossas experiências e crenças, personalidades e visões de mundo. O cérebro também sofre influências de propriedades autorregulatórias do organismo como sua busca por homeostasia (equilíbrio e estabilidade das funções do corpo). Isso significa que fome, estados afetivos, excitação sexual, hormônios, patologias cerebrais, produzem vieses que intensificam a atividade do S1, ativando respostas rápidas, não conscientes e impulsivas, levando a condutas de risco e a erros. Por isso é tão difícil realizar certas mudanças como, abolir vícios, abandonar condutas, ou fazer dietas. Não tome decisões com raiva, nem com fome ou tesão. Certas circunstâncias tornam nossa racionalidade limitada e isso demanda um esforço do S2 para operar controle inibitório adequado da conduta. E é por isso que nosso processo de tomada de decisão funciona “tipo livre arbítrio”.
Rui Mateus Joaquim é psicólogo
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