“Quem quiser meu endereço/ que não se faça de arrogado/ é só chegar lá em Andradina/ e perguntar pelo rei do gado”
Os últimos versos da canção que ficou marcada na voz de Tião Carreiro fazem alusão a um dos nomes mais famosos da pecuária brasileira do século passado, o fundador de Andradina, Antônio Joaquim de Moura Andrade. A alcunha, porém, torna-se singela quando se descobre as diversas outras facetas de Moura Andrade, como frequentemente é lembrado.
Dentre os grandes feitos do empresário estão o de ter iniciado e concretizado a aviação civil no País, junto com o amigo e magnata das comunicações Assis Chateaubriand.
O empresário, além de ter fundado as cidades de Andradina e Nova Andradina, participou da fundação de Águas de São Pedro junto com o irmão Octávio. Ele também foi o doador de uma obra de arte para o Masp (Museu de Arte Moderna de São Paulo).
Uma curiosidade: o sobrenome Moura foi adotado pelos irmãos devido ao nome do sócio Guilherme Moura, que dava nome ao empreendimento gerido por eles a “Moura Andrade e Cia”.
Quem atesta e amplia a visão do renomado empresário é sua neta, Stela de Andrade Haik, que revela outras facetas do famoso avô, de quem ela guarda inesquecíveis lembranças e as compartilha nessa familiar e agradável mensagem. Na propriedade que fora de Joaquim Teodoro de Andrade (tio-avô de Moura Andrade), Stela rememora os tempos em que circulava entre os maiores nomes do empresariado brasileiro sem se dar conta, à época, de que seu avô era um dos principais nomes do meio. Veja a seguir o relato de Stela.
MEMÓRIAS
A minha visão é bem de neta mesmo. Quando ele faleceu, eu tinha 12 anos. Lembro-me bem dele porque vinha muito pra cá. Nós éramos de São Paulo, então convivia bastante com meu avô e com minha avó. Depois disso, viemos para Andradina.
Quando nós mudamos pra cá, o vovô sempre vinha porque ia para a Fazenda Guanabara, vinha aqui para o frigorífico. Papai veio tomar conta do Frigorífico Mouran (que era de propriedade da família e atualmente hospeda uma unidade da JBS).
O vovô tinha uma memória incrível e eu me lembro de que chegávamos à Fazenda Guanabara e ele perguntava dos peões pelo nome. Ele tinha 14 fazendas e guardava o nome dos peões. Se ele fosse à casa de um deles e conhecesse a mulher do peão, ele guardava o nome, era impressionante!
Ele até contava uma historinha bonitinha, de quando ele chegou à Fazenda Guanabara e perto do curral tinha uma plantaçãozinha de eucalipto. Havia um menino ali perto do curral, ele chegou e chamou o menino: – fulano, (reconheceu o menino, que era filho de um peão) cadê seu pai? – Meu pai tá lá nos calipio. Aí, ele falou assim: não meu filho, calipio não, cê tem que aprender a falar direitinho, é eucalipto. O menino: Eu não, num sô arvi (risos)… E o vovô achava graça.
CHATEUABRIAND
Meu avô era piloto, ele foi responsável por trazer a aviação civil. Ele e o Assis Chateaubriand trouxeram os primeiros aviões, inaugurando a aviação civil no Brasil. Esse primeiro avião que eles foram buscar nos Estados Unidos, o Assis Chateaubriand foi junto com o vovô. O Chateaubriand ficava encantadíssimo como meu avô tinha facilidade pra declamar, e ele gostava muito.
Eles se admiravam mutuamente. O vovô também falava que ele era uma pessoa muitíssimo inteligente. E gostavam da companhia um do outro. Além dessa questão de terem feito algumas viagens juntos, também pelo próprio interesse jornalístico do Assis Chateaubriand no fato de o vovô na época estar em evidência e ascendência, tendo fundado uma cidade que estava progredindo muito, numa época que era do pós-guerra. Era inegável que meu avô era uma pessoa muito influente.
O Chateaubriand era um jornalista muitíssimo inteligente e por ser isso, sempre procurava se cercar de pessoas influentes. O pessoal fala que ele sempre fazia amizade com esse pessoal que tinha muito dinheiro.
Como gostava muito de obras de arte, então sempre tendo oportunidade e sendo amigo dessas pessoas influentes, sempre estava dando uma “facadinha” (vamos dizer assim né). “Oh, eu gostei de um quadro assim, muito bonito, você não quer fazer uma doação, pro nosso museu?”.
CAFÉ
Ele mudou-se para Santos, pois alugou um armazém pra estocar café, porque ele acreditava que estava em vias de estourar a guerra e por isso teve uma crise do café no Brasil e começaram a vender muito barato. Ele falou para o sócio que ia começar a comprar café e o sócio Seraphim Collettes disse: “Antônio você pirou de vez, se você quer comprar café eu estou fora da sociedade, comprem por conta de vocês”. Daí permaneceram ele e o Guilherme Moura.
Eles estocaram cada vez mais café e quando a guerra estourou ele tinha estocado e vendeu em dólar, que foi quando ele ganhou muito dinheiro e começou a comprar terra. Isso fez com que o outro sócio desistisse do negócio. O Guilherme Moura disse que não ia acompanhar mais, pois não queria ir para o interior, já que sua esposa era poetisa e queria publicar livros.
NORDESTINOS
Tinha um autor brasileiro, se eu não me engano chamava Catulo (da Paixão do Nordeste), ele é nordestino e fez aquelas rimas bonitas que falam da realidade nordestina e tudo. Acho que por conta disso, vovô gostava bastante.
Tanto que muitas pessoas achavam que meu avô era nordestino também. Sem contar o tipo físico dele, que era baixinho, “atarracadinho”, fortinho assim, mas ele nasceu em Brotas (num pequeno povoado chamado Espraiada do Varjão).
Na época da abertura da Fazenda Guanabara, teve uma seca muito prolongada no Nordeste, então ele ia de avião (ele tinha um Douglas DC3) para lá e lotava de gente que queria trabalhar aqui, por isso que a base da colonização de Andradina tem muito nordestino, por causa de ele ter trazido muita gente que acabou se fixando aqui.
FAMÍLIA
Quando os vovôs eram vivos, as férias eram sempre na fazenda perto de Mogi Guaçu, chama Fazenda Cataguá e era a fazenda preferida da minha avó. Quando morávamos em São Paulo, passava minhas férias com a vovó e iam todos os netos. Na adolescência, com 13 anos, vinham para minha casa, onde hoje é a Friboi. Às vezes, meus tios queriam ir para a Europa, mas meus primos vinham para Andradina.
Tem uma historia engraçada: minha irmã foi estudar secretariado no Mackenzie e tinham as menininhas tudo “grã-fininhas”. No final do período, perguntavam: “pra onde vocês vão nas férias?”. Umas para os Estados Unidos, outra para a França, a minha irmã e minha prima estudavam na mesma classe, e elas diziam: “vamos pra Andradina City”, e era aqui!
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